domingo, 4 de março de 2018

Nota Femnegras RJ : PORQUE NOSSAS VIDAS IMPORTAM!


 PORQUE NOSSAS VIDAS IMPORTAM!


Intervenção federal e racismo: nossas preocupações!

O Fórum Estadual de Mulheres Negras do Rio de Janeiro, organização de mulheres negras que atua no combate ao racismo, sexismo, pobreza e todas as formas de violência contra a mulher negra, assim como no papel de identificar seus desdobramentos violentos. É deste lugar que nos dirigimos aos senhores: presidentes, respectivamente, da Câmara dos Deputados e Senado Federal -  Rodrigo Maia ( DEM-RJ) e Eunício de Oliveira ( MDB – CE) e também ao Presidente da República, Michel Temer, ao Ministro da Segurança Pública Nacional, Senhor Raul Jugmann, ao Senhor General Braga Netto, interventor federal e `a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.


Hoje o estado do Rio de Janeiro está sob intervenção. Entendemos que se trata de intervenção militar do governo federal na segurança do estado, conduzindo a mesma, para o estabelecimento de novas estruturas de segurança da ordem pública (que sabemos que esta não se estabelece com polícia e forças armadas. Este momento, contudo, nos coloca em total alerta e assombro, uma vez que as experiências vivenciadas das ações do estado no combate á violência, em contato com crianças, jovens, mulheres e homens da população negra tem sido  na base do desrespeito, truculência, assassinatos, cuja eficiência é, exclusivamente no que tange a  violação dos a Direitos e dos Direitos Fundamentais.


 Fato que  necessita ser salientado é que nossas crianças e adolescentes, desde a mais tenra idade, têm crescido sob a mira  das armas, sejam estas dos   traficantes ou das   polícias o , construindo, no imaginário desses jovens, a convicção de que existe somente um caminho: o da força das armas. Independente do lado, não soluciona os problemas, apenas torna a morte violenta como algo rotineiro e banal, nós, deste estado assistimos a isso inclusive, durante a implementação das  UPPs, que  também trouxeram para nós experiências de abuso de toda ordem, principalmente os direcionados `as mulheres e sobretudo as mulheres negras jovens moradoras daquelas favelas  e, quando falamos de abusos, nos referimos também de assédio, agressão e estupro. Além do já relatado, protagonizaram a interrupção das práticas culturais , comunitárias e religiosas de nossas favelas: proibiram o Funk,   o Passinho, as rodas de rima. Expulsaram terreiros de candomblé e umbanda e hostilizaram membros das igrejas pentecostais. Somente terror, nenhuma ação tática ou de inteligência . Certamente não foram em todas, mas há muitos  artigos e matérias jornalísticas que confirmam esses  episódios de violência desgovernada.

 Vivemos em um país cujo o racismo é estrutural e, como tal, influencia todos sistemas que regem a sociedade e  assim como os referenciais simbólicos  que nelas habitam e, neste contexto, a população negra, especialmente os  jovens negros são vistos a partir de estereótipos que, de acordo com a ordem conservadora  e racista, justificam abordagens policiais abusivas, prisões infundadas e assassinatos.


O Rio de Janeiro é um estado cujo número de assassinato de jovens negros e negras tem sido crescente.
Só que entendemos que é da ordem da segurança pública garantir o direito da cidadã e do cidadão o direito à vida e, com ele , o direito de  expressarem suas diferenças individuais inclusive nas roupas, adornos e cabelos, sejam estes Black Power, Escovinha, Dread Lock, Coloridos, Trançados, Descoloridos ou  Do Jaca. Ainda pensando nos estereótipos, é direito de nossos jovens irem à praia, `a praça,  ao parque no tempo que desejarem, desfrutando do Direito de ir e vir, sem que isso ressuscite os já revogados Lei da Vadiagem ou Ato de Resistência.

Colocamos nossas preocupações como ativistas e também nosso  o desejo de que esta ação interventora, que deverá ser estratégica e planejada, não ultrapasse o âmbito da segurança pública, respeitando o Estado Democrático de Direito, no que se refere aos atos políticos e manifestações públicas,  como preconiza a nossa Constituição Federal, promulgada em 1988 .

Compreendendo que segurança pública deve envolver participação ativa de cidadãs, cidadãos e da sociedade organizada, temos a expectativa de que o plano para o enfrentamento `a violência seja apresentado para a  população do Rio de Janeiro e que deixe público  quais as metas e  prazos e que, de forma alguma, referende repressões, ações vexatórias, mandados coletivos, torturas de qualquer ordem  e, muito menos ações racista, em  que negras e negros sejam alvo.

Para melhor desenvolvimento do projeto de intervenção, reivindicamos que não seja esquecido que vivemos em um estado desgovernado e que a corrupção, os desvios, a lavagem de dinheiro, as negociatas e os roubos muito contribuíram para fragilizar a segurança, além de precarizarem os serviços essenciais à vida e ao desenvolvimento social e econômico.

Atentas às declarações do Presidente da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia, realizada  sábado, dia 17 de fevereiro de 2018, e veiculada na tv  e na internet, sobre seu interesse de  que a intervenção seja organizada e efetiva em todo o Rio de Janeiro e , para tanto, pretende criar um observatório, considerando o papel da Câmara enquanto fiscalizadora das ações do governo federal e, neste sentido,  entendemos que seja pertinente criar, junto a este observatório, uma ouvidoria que recolha, dentre outras coisas, denúncias de  possíveis casos  de  violações de direitos humanos e que os fatos recebidos, apurados e em andamento sejam  amplamente divulgados em relatório periódico. De mesmo modo sejam apresentados dados da fiscalização das ações desta intervenção do governo federal na segurança pública do Estado do Rio de Janeiro.

Por fim, reafirmamos a importância de que, em nome da segurança e da ordem pública, a Constituição Federal não seja violada ou que justifiquem o resgate de ações e práticas da ditadura e que, as ações espetaculares não nos matem, servindo apenas de um instrumento eleitoreiro para manutenção do golpe e dos golpistas no poder.

MULHERES NEGRAS, CORAGEM, RESISTÊNCIA E DETERMINAÇÃO - PORQUE NOSSAS VIDAS IMPORTAM!

Assinam: Fórum Estadual de Mulheres Negras do Rio de Janeiro
femnegrasrj@gmail.com